A-VÓS é uma dança em homenagem àqueles que nos precederam, aos pais de nossos pais e aos nossos ancestrais míticos. Dançamos vidas-memórias, espaço em que reelaboramos nossos afetos e imaginário e nos conectamos com o que nos move no constante ato de criação do presente.
Diante de uma sociedade ocupada com a satisfação imediata de seus desejos – que esquece o passado e projeta o novo ao invés do futuro, que consome desenfreadamente e descarta sem pudores o que considera ultrapassado ou obsoleto, trazendo no próprio corpo o horror ao velho e ao envelhecimento – reverenciar os “nossos velhos” vai na contracorrente e assume-se um ato estético-político.
Dançamos a sabedoria coroada por seus cabelos alvos, suas vozes em palavras que nos ajudaram a olhar o mundo e também suas mãos conhecedoras de seus ofícios. A alfaiataria, o bordado, a marcenaria, a construção civil, a música e o canto são marcas inscritas em seus corpos, na delicadeza ou na rudeza dos gestos que nos inspiram a criar este espetáculo. Vidas-memórias dos que estão conosco e dos que vivem em nós, que nos deram colo como quem assenta chão seguro para pisar, camadas de tempo real, cíclico, espiralar que sempre retorna nas histórias, ou na imagem desbotada de um retrato antigo.
A trilha de nossos afetos mais íntimos também nos levam ao encontro dos “avós do mundo”, ancestrais que habitam o mistério e os mitos. Evocados na encruzilhada dos caminhos trilhados por cada bailarino-criador, onde o contato com os rituais funerários dos índios Bororos, com a dança butô e com as danças e narrativas de tradição banto, são ressonâncias que nos serviram como chaves para a abertura de um espaço-tempo mítico. Aqui, reelaboramos nossos afetos e o imaginário, além de nos conectarmos com o que nos move no constante ato de criação do presente.