Uma performance em que um homem morto e duas mulheres feridas convidam o público para um velório coletivo em que a postura diante do luto é colocada em questão. Essa é a proposta de “Caixa Preta”, instalação teatral que discute do tabu da morte.

 

Nascida do encontro do diretor argentino Fernando Rubio e das atrizes Giulia Grandis e Ludmila Wischansky, a obra teve como inspiração e ponto de partida a escultura “Pai Morto”, de Ron Mueck, e o livro “História da morte no ocidente”, de Philippe Ariès, além de vivências dos três relacionadas à morte e ao luto.

 

A performance começa na rotunda do CCBB, com as duas atrizes atravessando o cotidiano dos visitantes do centro cultural antes mesmo de ingressarem no Teatro III. Em cena, as duas mulheres encontram-se diante de um cadáver de um homem. A disposição cênica e projeções nas paredes convidam o público a circular pelo ambiente para velar esse corpo sem vida.

 

É justamente essa contemplação fúnebre que dispara e desenvolve a relação entre as personagens e os espectadores. Não se sabe quem são essas mulheres, nem qual é a relação delas com   o falecido. A cada situação, conversa, silêncio, projeção, movimentação se torna mais presente o mistério e a curiosidade sobre as duas.

 

“Não quis me limitar ao campo das ações. ‘Caixa Preta’ é um trabalho de reflexão sobre a experiência de cada um. É sobre a morte de pessoas que temos contato, de desconhecidos, e da expectativa da nossa própria morte, e como nos comportamentos diante dessa realidade.

 

É a vivencia o luto coletivo, numa sensibilidade que atravessa a todos nós”, conta o diretor Fernando Rubio. “Assim como em um velório, o público tem a liberdade de permanecer no Teatro III o tempo que desejar. Pode também sair e regressar quantas vezes julgar necessário, assim como as atrizes. É possível, também, acompanhar tudo à distância, por meio de totens espalhados pelo CCBB que transmitem em tempo real a performance”, explica.

 

A dramaturgia inédita de Fernando Rubio foi construída durante o processo de criação da montagem a partir de um desejo comum entre as atrizes Giulia Grandis e Ludmila Wischansky e o diretor em falar sobre a morte, um tema por muitas vezes desconfortável, porém natural e inevitável.

 

“Caixa Preta” propõe um olhar reflexivo, crítico, amoroso, por vezes dramático, por vezes humorado, sobre nossos comportamentos e construções face à morte. “‘Caixa Preta’ trata da morte num conceito mais arquetípico num lugar que transcende o teatral”, define Ludmila Wischansky. “Propõe ainda outra construção ritualística por meio de um olhar renovado e não fixo em relação ao luto”, completa Giulia Grandis.

 

“Caixa Preta” é a quinta montagem de Fernando Rubio a ser apresentada no CCBB. Conhecido por suas intervenções artísticas ao ar livre e em centros culturais, o artista esteve no festival Cena Brasil Internacional em 2013 como o projeto “Podem deixar o que quiserem” e em 2014 com “Tudo ao que esta ao meu lado“, uma performance realizada na rotunda do CCBB.

 

Ano passado, o artista argentino levou para o mesmo festival as intervenções “O tempo entre nós” e “Eu não morro, não mais“, que foram realizadas com atores brasileiros.