A invasão dos cigarros eletrônicos reacende a discussão sobre como lidar com o tabagismo, sobretudo entre os mais jovens
Eles não soltam fumaça fedida, não causam mau hálito nem espalham bitucas. À primeira vista, os cigarros eletrônicos, também chamados de vaporizadores, são o sonho de consumo de muitos fumantes. Diferentemente da versão de papel, que queima por combustão, o modelo funciona à base de vaporização. O dispositivo contém um líquido que, ao ser aquecido, gera o vapor aspirado e exalado pelo usuário. Segundo os fabricantes, essa seria a razão que torna os eletrônicos menos prejudiciais que os tradicionais. Mas há controvérsias. E a comunidade médica enxerga com preocupação a popularização desse novo jeito de fumar.
Nos Estados Unidos, que contabilizam mais de 9 milhões de vapers, como são conhecidos os adeptos dos dispositivos eletrônicos de fumar (DEFs), uma síndrome respiratória misteriosa já matou 12 usuários em pouco menos de um mês.
No mesmo período, 805 casos foram registrados em 46 dos 50 estados americanos. Mais da metade dos pacientes tem menos de 25 anos e três quartos são homens. Eles costumam chegar ao hospital com dor no peito, dificuldade para respirar e febre alta.
O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), do governo americano, admite não saber o que está por trás. Suspeita-se que seja o THC, componente psicoativo da maconha, que alguns vapers adicionam ao cartucho com nicotina líquida. Na dúvida, a agência de vigilância sanitária americana, o FDA, recomenda à população evitar, pelo menos por ora, a versão high-tech.
Por medida de segurança, alguns estados, como Michigan e Nova York, já proibiram a venda de modelos com sabor, segmento que representa 80% do total. Outros, como Massachusetts, estenderam a restrição a todo e qualquer dispositivo eletrônico
Até o momento, nenhum dos 180 países membros da Convenção — Quadro de Controle do Tabaco, da Organização Mundial da Saúde (OMS), relatou casos semelhantes. Pelo sim pelo não, a Índia, o segundo maior consumidor de tabaco do planeta, também barrou a venda dos cigarros eletrônicos.
No Brasil, onde a comercialização desses aparatos é proibida mas eles se mostram cada vez mais acessíveis, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) solicita a hospitais que notifiquem casos suspeitos de problemas ligados a vaporizadores.
“Embora possam ser menos tóxicos que os cigarros convencionais, não quer dizer que eles sejam inofensivos”, adverte o porta-voz da OMS, Tarik Jasarevict. “Tampouco existem evidências de que eles ajudem a parar de fumar”, ressalta.
Na contramão das nações que restringem os e-cigarettes, o Reino Unido considera o alerta global alarmista. “Há quem diga que eles podem levar os mais jovens a fumar. Por aqui, pesquisas confirmam que o número de não fumantes que fazem uso de vaporizadores representa menos de 1% da população”, rebate o psicólogo Robert West, da University College London.
Além disso, cientistas britânicos acreditam que vaporizadores ou dispositivos de tabaco aquecido podem ser úteis como estratégia de redução de danos. Segundo um levantamento de 2014, para cada milhão de fumantes que substituem os modelos comuns pelos eletrônicos, mais de 6 mil vidas seriam salvas por ano.
No Brasil, país considerado referência mundial no combate ao tabagismo, o índice de fumantes é de 9,3% da população — há 30 anos, chegou a ser 34,8%. Pelo raciocínio britânico, se os 18,2 milhões de fumantes brasileiros migrassem para o modelo eletrônico, 108 mil vidas seriam salvas por ano. Mas esse cálculo não é tão puro e simples assim. E os médicos têm sérias restrições a ele.
O que o povo anda fumando por aí
Cigarro comum: é o modelo convencional. Ao ser acendido, o fogo queima as substâncias perigosas à saúde, como nicotina, alcatrão e monóxido de carbono. O mesmo vale para charuto e cachimbo. Todos levam à dependência.
Eletrônico: no lugar da combustão do cigarro comum, o princípio aqui é a vaporização. A dosagem de nicotina varia de acordo com o fabricante. A mais baixa equivale a seis cigarros comuns. A mais alta a 18. Há versões aromatizadas.
Tabaco aquecido: também funciona por vaporização. Mas, em vez de aquecer nicotina líquida, esquenta lâminas de tabaco. Quarenta e oito países, entre eles Canadá, Japão e Alemanha, já comercializam o IQOS, o produto da Philip Morris.
Artesanal: tem vários tipos, boa parte deles compostos de 70% de tabaco e 30% de cravo — um dos apelidos é cigarro de bali. O popular cigarro de palha, por sua vez, tem de cinco a sete vezes mais nicotina e alcatrão que os convencionais.
Inalável e mascável: rapé (tabaco inalável), snus e fumo para mascar são exemplos de produtos de tabaco sem fumaça. Em vez de fumar, o usuário aspira, masca ou suga o tabaco. Todos podem propiciar lesões na boca ou na garganta.
Narguilé: de berço oriental e hoje popular no Brasil, o aparato também se vale da vaporização. De uso coletivo, o “cachimbo d’água” não deixa de oferecer riscos. Uma sessão de 20 a 80 minutos corresponde a fumar 100 cigarros.
Fonte: Saúde Abril.
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