Baseado no romance homônimo do escritor e dramaturgo alemão Heinrich Böll, Prêmio Nobel de Literatura em 1972, o texto, adaptado pela diretora Maristela Chelala, lança luz na alteridade que está no cerne da arte do clown. Com um recurso perspicaz, ela desloca o foco do protagonista amargurado do livro de Böll, Hans Schnier, e o fragmenta entre Hans e seu alter ego, um palhaço chamado Schnier – que, na adaptação de Chelala, se transforma no narrador da história, criando novas possibilidades de humor para a peça
“Estou com problemas com o meu sócio”, desabafa o palhaço no divã, logo na primeira cena: “Ele é um irmão que não é um irmão, mas é como se fosse. Que você ama e odeia ao mesmo tempo.” É assim, referindo-se a si próprio na terceira pessoa, que Schnier conta seus percalços – de artista errante na traumatizada e hipócrita Alemanha do pós-Segunda Guerra, que interrompe sua turnê após ser abandonado pela namorada católica, Marie – em uma narrativa pontilhada por “desvaneios”, como ele diz.
Para interpretar a crise de identidade do personagem, Daniel Warren passeia por estados de espírito opostos, da graça ao sarcasmo e à revolta, manipulando com sutileza a máscara do palhaço para alternar-se entre Hans e Schnier. “A arte às vezes pode parecer terapia, mas não é”, explica o ator e palhaço sobre seu processo de criação: “Só que para mim não tem outro jeito de fazer que não seja me colocando totalmente nisso. E se eu me coloco, eu me vejo, reflito e transcendo”. A diretora Maristela Chelala concorda: “Quando estamos fazendo arte, se estamos ali de coração, estamos falando da nossa vida”.
A decadência do palhaço se segue a uma desconcertante briga de casal que expõe não só a divergência de valores religiosos e sociais entre o protagonista e Marie, mas a intolerância da própria sociedade.
sábados às 21h e domingos às 19h.